O líder felino e o Caso Toyota

02/03/2010 14:04

O líder felino e o caso Toyota
*Alfredo Passos


“Se não fosse pelas pessoas, sempre presas às máquinas, a Terra seria o paraíso dos engenheiros.”
Engenheiro Ed Finnerty em Player Piano de Kurt Vonnegut

Embora a repercussão no Brasil tenha sido menor que no Japão e nos Estados Unidos, não é possível ignorar a situação do recall dos modelos de automóveis da Toyota.

No Brasil atual temos uma cultura de consultores de empresas e líderes empresariais, ainda muito voltados a orientação estratégica para produção. Ou seja, acreditam que o produto é o ator principal e que fazendo tudo em torno do produto, a situação da empresa estará resolvida. Até esta mesmo, pois os lucros crescentes (e também as demissões) não deixam dúvidas.

Mas e os seus profissionais? E "os empregados", "os funcionários, "os colaboradores"? Estão em segundo plano, junto com os clientes e consumidores. Por isso, o número cada vez maior de "recalls" e também do número de reclamações nos Procons.

O mundo mudou mas alguns gestores ainda não

Mas o mundo mudou após o 15 de setembro de 2008. Outros teóricos e teorias circundam o mundo atual e mencionam que é hora de orientar-se para o mercado. É preciso ver os avanços da sociedade de consumo atual que exige mais das empresas.

O Sistema Toyota de Produção desenvolveu consistentes métodos de gestão da produção e do trabalho como: Heijunka, Kanban, Troca Rápida de Ferramentas (SMED), Poka-Yoke, Células de Manufatura, que muitos consultores de empresas e líderes empresariais procuram copiar e implantar nas empresas no Brasil. Mas o brasileiro não é o japonês.

Falar de PDCA, ou Planejamento, Execução, Verificação e Ação aumenta o lucro das empresas, o ganho dos seus acionistas, mas cria um ambiente empresarial de muito conflito interno, de falta de respeito as pessoas, além dos problemas de saúde cada vez mais comum, que faz com que de tanto pensar em reduzir e cortar custos, faz com que as empresas aumentem "os seus custos" (e claro também do sistema de saúde do Brasil).

É preciso questionar se este tipo de meritocracia e competição sem limites dentro da empresa, não deve ser revisto. Tem empresas, com líderes batendo (fisicamente) em seus funcionários e em outras empresas, líderes estão praticando assédio moral, "esculhambando, xingando funcionários na frente de qualquer um, não só de funcionários da empresa, mas de funcionários, agências..."Será que os trabalhadores brasileiros querem este modelo?

Por isso, gosto muito da frase do Engenheiro Ed Finnerty em Player Piano de Kurt Vonnegut “se não fosse pelas pessoas, sempre presas às máquinas, a Terra seria o paraíso dos engenheiros.”

Em Building the Bridge as You Walk on It, Robert Quinn afirma que não é possível reproduzir o sucesso de uma empresa com a mera imitação de suas técnicas “quando estamos discutindo técnicas, esquecemos a importância da liderança.”

Como copiar um modelo de gestão ou produção, mas sem ter a cultura e a infra-estrutura, no caso Toyota, para implantar em uma fábrica na cidade de Caxias no Rio Grande do Sul, em Uberlândia - Minas Gerais ou em Recife – Pernambuco?

Um novo tipo de gestor nas empresas no Brasil


Se fizermos uma avaliação mais ampla para ver quais são as razões para tantos “recalls”, bela palavra em inglês, mas que em português, quer dizer “defeito” pode-se ver que a motivação pelo crescimento constante, maiores lucro e maior rentabilidade, levou as empresas a gerar um novo tipo de líder: o líder felino (o gato é extremamente individualista e solitário).

Os gatos são exímios caçadores, por isso, temos gestores em empresas no Brasil que se comportam assim, ou seja, perseguem um funcionário até ele se demitir ou ser demitido.

Terapeutas, familiares, amigos, escutam reclamações cada vez maiores sobre os “chefes” que as pessoas tem na empresa.

É muito comum falar da mudança de comportamento do chefe, um dia até cumprimenta e fala bom dia, já no dia seguinte nem olha na cara.

Novamente, o comportamento do “líder felino”. Pesquisas indicam que, tanto no homem, como no gato, o mesmo setor cerebral é o responsável pela existência de diferentes emoções (longe de dizer que seu chefe pode ser bipolar).

E nesta seqüência o “líder felino” vira o “líder ferino”, que tem por norma “ferir” as pessoas, porque o que realmente importa é promoção individual, o bônus pessoal no final do ano, os benefícios que a empresa oferece a sua pessoa. E a empresa? Bem se tiver lucro, melhor ainda. Mas e o País? Bem, deixa isso para depois da Copa do Mundo de Futebol, eleições...

*Alfredo Passos, apassos@espm.br, Partner da Knowledge Management Company, Professor ESPM, Membro da Society of Competitive Intelligence Professionals - SCIP, autor de “Inteligência Competitiva – Como Fazer IC Acontecer na Sua Empresa